10 dezembro 2017




O Espírito de Natal

Há quem se alegre com a aproximação do Natal, há quem fique deprimido. Costumo pertencer ao primeiro grupo. Quando, porém, não tenho ocasião de ir passar o Natal à pátria, momentos há em que a tristeza lança uma mancha de tinta negra sobre o colorido da festa.
Há uns anos, caí num poço melancólico, que me fez acreditar ser impossível recuperar o espírito natalício. Desejei que o Natal passasse depressa. Depois da Consoada, desejei adormecer tão fundo, que só acordasse no dia 26, já a pensar no Ano Novo.
De manhã, porém, a minha cadela Lucy começou a mostrar sinais de impaciência logo às oito horas. Mas que maneira de iniciar o Dia de Natal, a amaldiçoar a bicha! Lá me levantei e fui dar a volta com ela, ainda antes do pequeno-almoço.
Estavam dez graus negativos, havia neve no chão... Mas eu procurava em vão o espírito de Natal.
Cruzei-me com um homem que conheço de vista, também a passear o seu cão. Em vez do habitual «Guten Morgen» (bom dia), saiu-me: «Frohe Weihnachten» (Feliz Natal). O homem abriu um grande sorriso e respondeu: «Danke, gleichfalls» (obrigada, igualmente).
Senti-me quente por dentro, como se tivesse bebido um café. Alguns metros mais à frente, apercebi-me de que um ciclista se aproximava, por trás de mim. Há muitos ciclistas na Alemanha, eu própria ando frequentemente de bicicleta. Mas, com aquele frio... E o passeio apenas limpo de neve numa faixa estreita...
Pensei: não me desvio, o passeio é para os peões, ele que mude para a rua. A rua, porém, parecia muito escorregadia. Parei, cheguei a Lucy a mim e deixei espaço para o ciclista passar. O homem abriu um grande sorriso, disse: «Muito simpático da sua parte! Obrigado». Tive de sorrir também: «De nada».
Quando cheguei a casa, o meu marido já tinha preparado o pequeno-almoço: o café quentinho, o pão torrado e estaladiço, a manteiga... A sensação de conforto tomava cada vez mais conta de mim, preenchendo o vazio...
Afinal, não me tinha deixado, o espírito de Natal.



Cristina Torrão
Texto baseado numa publicação no blogue “Andanças Medievais”:
                 https://andancasmedievais.blogspot.de/       

1 comentário:

Odete Ferreira disse...

A prova de que o espírito de natal (também) é feito de vontade... Inspirador relato.
Parabéns, Cristina Torrão.